[MÚSICA] [MÚSICA] Dois, dois, três e... [MÚSICA] [MÚSICA] [MÚSICA] [MÚSICA] Ninguém ouviu soluçar de dor [MÚSICA] No canto do Brasil. Lamento triste sempre ecoou [MÚSICA] Desde que o Ãndio guerreiro foi pro cativeiro e de lá [MÚSICA] cantou. Negro entoou [MÚSICA] Canto de revolta pelos ares no Quilombo dos Palmares [MÚSICA] onde se refugiou. Fora a luta dos Inconfidentes [MÚSICA] pela quebra das correntes nada adiantou [MÚSICA] E de guerra paz, de paz guerra, todo o povo dessa terra [MÚSICA] quando pode cantar, canta de dor. [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô. E ecoa noite [MÚSICA] e dia. É [MÚSICA] ensurdecedor. Ai, mas que agonia [MÚSICA] o canto do trabalhador. [MÚSICA] Esse canto que devia ser canto de alegria [MÚSICA] Soa apenas como soluçar de dor. [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô. Ninguém ouviu soluçar de dor [MÚSICA] no canto do Brasil. Lamento [MÚSICA] triste sempre ecoou desde que o Ãndio guerreiro foi pro cativeiro e de lá cantou. [MÚSICA] Negro entoou [MÚSICA] canto de revolta pelos ares no Quilombo dos Palmares [MÚSICA] onde se refugiou. Fora a luta dos Inconfidentes pela quebra das correntes [MÚSICA] nada adiantou. E de guerra [MÚSICA] paz, de paz guerra, todo o povo dessa terra [MÚSICA] quando pode cantar, canta de dor. ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô [MÚSICA] ô, ô, ô, ô, ô, ô. [MÚSICA] [MÚSICA] Meu pai era mestre da banda da polÃcia militar no estado do Maranhão e ele ensinava na Escola Técnica também. Foi com ele que eu aprendi música e meus irmãos também. Meu pai tinha uma caligrafia musical muito bonita e eu adorava ver meu pai molhando aquela caneta no tinteiro, fazendo a nota e depois passando o mata-borrão. Era processo que me deliciava ver fazer aquilo. Ele tinha uma caligrafia das mais bonitas que eu já vi até hoje. E eu fazia cópia à s vezes de arranjo para ele e eu procurava imitar. Claro, eu nunca cheguei ao pés dele. A música sempre esteve na minha vida, por isso, a orquestra do meu pai, que ele tinha uma orquestra também, ensaiava na sala da minha casa. Aprendi também solfejo, eu aprendi ler música, divisão, tudo. Eu aprendi pelo Paschoal Bona. Então, a gente tinha que primeiro aprender música, primeiro a teoria musical, solfejo, dividia para depois tocar o instrumento. Então depois foi que eu fui cantar. E essa coisa de ter aprendido música me favoreceu muito. Eu gosto muito disso. Eu tocava clarinete, trompete e saxofone alto. E o trompete é mais instrumento que eu ainda toco mais hoje. E minha mão não queria que eu tocasse trompete porque eu era muito magrinha, era sequinha. Achava que eu ia ficar tuberculosa. É nada disso. Foi o melhor para mim porque eu era asmática quando eu era pequena, quando eu era menina, e o sopro me colocou boa da asma. Foi bem para mim aquilo. Ela queria que eu tocasse acordeon, como todas as moças da minha cidade, que sentavam no piano ou então com o acordeon. Meu pai dizia: "Isso é instrumento para cego". Meu pai tinha preconceito com acordeon. Eu digo: "O que é isso chefe? E Sivuca? E LuÃs Gonzaga? E esses outros?". Ele dizia: " não, mas esse povo aà é diferente". Mas ele não queria que eu aprendesse a tocar acordeon porque ele queria me ensinar instrumento de sopro que ele sabia. Eu cresci São LuÃs do Maranhão, norte do Brasil. Na região Amazônica. O lugar que eu nasci é uma ilha. Ilha de São LuÃs. Lá quando faz calor é 40 graus à sombra. É por isso que eu estranho o frio muito. Lá São LuÃs eu só estudava porque eu sou professora. Eu fiz até o curso normal e ainda ensinei dois anos no colégio São LuÃs no lugar da minha professora de música porque ela foi de férias para Salvador, e eu fui ensinar teoria musical. Fui ensinar a ler as notas. E eu fiquei dois anos no colégio São LuÃs, mas acontece que dia eu fui tocar trompete para a turma ficar silêncio. Eu prometi que tocaria trompete no final da aula e o diretor da escola me expulsou, me demitiu. Quer dizer, hoje eu até seria uma professora que todo mundo queria, mas naquela época não podia subir na mesa e fazer show para os alunos. Eu comecei cantando mesmo foi no banheiro. E meus vizinhos do fundo de quintal lá de casa, toda vez que eu cantava eles me aplaudiam, pediam para repetir. Aquele foi meu primeiro público. E dia a orquestra do meu pai, eu estava assistindo a orquestra tocando. Claro, ali sentada perto do meu pai. Meu pai era ciumento da gente para caramba. Foi quando o cantor da orquestra do meu pai não veio, ele tava gripado terrivelmente. Aà meu irmão mais velho, que já faleceu, já fez a passagem, falou: "Eh chefe, porque que o senhor não põe a Alcione? A Alcione canta bem.", que ele cansou de me ver cantar lá no quintal. Meu pai: "Ela vai cantar?". "Canto.". Aà eu comecei cantando. Eles queriam contratar a orquestra, só comigo cantando, e meu pai não podia porque eu tava estudando, e ele não deixava. Mas aà eu descobri que eu queria ser mesmo era cantora. E foi aà que ela veio para a minha vida. A minha ida para o Rio, olha... Eu lutei anos pedindo para o meu pai para ir para o Rio e ele falou: "Só depois que se formar e ainda tem que lecionar dois anos no Maranhão. Depois você vai". Aà eu fui. Fui morar com o meu irmão e minha tia. Fui para o Rio de Janeiro. Nossa senhora! O Rio de Janeiro é mundo grande que se abriu para mim. Eu comecei fazendo programa de calouros. Fiz a Grande Chance. E EmÃlio também. EmÃlio fez mit, ganhou, e eu fiz a Grande Chance. EmÃlio Santiago. Grande cantor brasileiro. Trabalhei na noite do Rio de Janeiro e de São Paulo, muitas casas. Depois eu conheci Jair Rodrigues São Paulo, numa boate chamada Blow Up, e daà foi que ele disse: "Nega, você vai fazer o que agora?". E eu digo: "Eu vou para a Europa semana que vem, ficar dois anos.". Aà ele falou: "Poxa, seu lugar é aqui no Brasil, nega. Quando você voltar me procure." E eu fiz isso. Depois de dois anos eu fui procurar Jair e ele me apresentou Roberto Menescal na PolyGram, hoje Universal, e foi que eu gravei o meu primeiro disco. Meu primeiro sucesso mesmo foi Não Deixe o Samba Morrer, que é a música de dois baianos, Edson e AloÃsio. Quando ela começou a tocar na rádio eu fiquei 22 semanas primeiro lugar. Essa música praticamente construiu a minha carreira. Ela é gravada italiano, gravada hebraico, é gravada japonês. Várias lÃnguas gravaram Não Deixe o Samba Morrer. A cena musical da música no Rio de Janeiro era uma época, tipo assim, só homem que vendia disco. Mulher não vendia disco. Quem quebrou este tabu foi Clara Nunes. Mas ali era uma época também de Elza Soares, Sérgio Mendes tinha vindo para cá, feito muito sucesso. Wilson Simonal tinha acontecido. Os festivais tinha acabado de acontecer com Caetano Veloso, Milton Nascimento, Nara Leão, Elis Regina, e aquele povo foi que eu conheci depois, porque as pessoas que eu ouvi primeiro na minha ilha São LuÃs foram Angela Maria, Luma Lafaiete, Dalva de Oliveira, essas cantoras que eu aprendi a cantar ouvindo. Eu vim para a época desses artistas. E aà foi que eu comecei a procurar o meu estilo. Foram pessoas com as quais eu aprendi muito também. Clara Nunes, além de ser uma grande cantora, a nossa amizade começou, por incrÃvel que pareça, através do meu maquiador, que também já fez a passagem. Ele era o mesmo maquiador de Clara. Tanto que no dia que a gente ia desfilar na Marquês de SapucaÃ, ele ia lá para casa com a maquiagem azul e branca, que ela era Portela, e a verde e rosa. Eu sempre gostei sempre dela. Ela parecia uma protetora para mim. E éramos muito amigas mesmo, tanto que Clara Nunes, que era uma pessoa que tinha repertório maravilhoso, uma voz lindÃssima, eu fiz disco homenagem a ela, chamado Claridade. Porque eu sempre chamava ela de Claridade. E no dia que ela fez a passagem eu fiquei muito mal. Custou muito a minha ficha cair, mas depois a espiritualidade me ensinou que não é assim. Que nós temos que deixar a pessoa partir paz. Foi aà que eu encontrei pouco de sossego para a minha vida e comecei a achar normal a passagem de Clara Nunes. Na minha carreira, depois as coisas começaram a ser aceitas, porque no princÃpio o produtor queria mandar muito mim. Ele queria que eu só gravasse Samba e eu sabia que podia cantar outras coisas. Então dia eu mandei uma música só no meu disco para eles, que foi "Nada como dia atrás do outro". Essa música fez tanto sucesso na novela Pai Herói, que depois o meu diretor artÃstico, que era Menescal, dizia: "Você vai cantar mais música romântica." Eu comecei a cantar qualquer dia desses e começou sempre misturando Samba, cantando Samba, o Reggae do Maranhão, o Bumba Meu Boi, o Forró. Porque eu nunca fiz disco linear. Eu sempre gostei que tivesse essas coisas que faziam parte da minha vida. E aà pronto. O povo se acostumou que no meu disco você pode achar romântico, pode achar Samba, pode achar tudo. Eu acho que todo mundo devia aprender a tocar instrumento. Por mais simples que fosse. A música, você tem que ter noção dela e tirar partido dela. Então, as notas musicais não estão aà por acaso. Elas têm trabalho a fazer com todo mundo, não só com o cantor. E eu estou muito feliz de saber que a Berklee vai para o Brasil também com curso para pessoas que não tem recurso para estudar música fora. Isso vai ser muito bom no Brasil. Vai ser muito útil para os jovens que querem estudar música, que querem aprender. A gente trabalha com essas coisas no Brasil, para os jovens, e meu projeto social sempre foi também direcionado a isso. No Brasil eu fundei a Mangueira do Amanhã, que é projeto meu e da Mangueira. São os ritmistas do amanhã. Hoje já tem 60 ritmistas rapazes na bateria da estação primeira, da grande. E mestre sala e porta bandeira saÃram da minha escolinha também. E a rainha de bateria, que é hoje a melhor rainha de bateria do Brasil, era da Mangueira do Amanhã. Enfim, todo mundo extraÃdo de lá mesmo, da favela, do morro. Porque todo mundo tem o seu potencial. E por isso que eu acredito muito que esse trabalho da Berklee junto à s comunidades no Brasil vai ser sucesso e vai ser uma coisa que nós estamos precisando muito.